quarta-feira, 15 de junho de 2011

Para os boêmios...

Hora do fechamento do jornal. Redação lotada. Gritos para todos os lados, e pautas caindo. A capa daquela edição foi mudada por uma notícia de última hora: naquele dia, logo antes, os trabalhadores do porto decidiram a greve. O editor, quase exasperado, brigava com os repórteres, ordenava retiradas de matérias, e mandava outros para cobrir a greve. Aos poucos, o clima foi acalmando. Os repórteres chegaram com uma foto perfeita para a capa: os operários, sentados em pequenos bancos, utilizavam as caixas de carga que deveriam carregar como mesa de pôquer.

Enquanto a edição está rodando na gráfica, o editor caminha pela rua, sem destino certo. Para casa, não queria ir. Apesar do cansaço, não conseguiria dormir após o stress do fechamento. Decidiu tomar uma bebida, e seguiu para um bar já conhecido, perto da redação.

Perto da meia noite, o bar lotado. A música, mal se escuta. O barulho das conversas se mistura com um saxofone de fundo. O ambiente enfumaçado camufla os boêmios, que bebem uísque e conversam sobre a greve. Dentre as várias pessoas no ambiente, nenhuma se destaca. O editor caminha até o bar e pede uma bebida, enquanto escuta trechos de conversas, pensa na repercussão que a capa vai dar dali a poucas horas.

Dois homens, pelos 40 anos interrompem sua conversa politizada quando uma mulher entra no bar. Visivelmente ela não pertence àquele ambiente. O vestido preto contorna perfeitamente seu corpo, e parece ser uma segunda pele. Seu cabelo, loiro, está moldado com laquê, o que a torna mais atraente. A estola que a envolve, feita de pele branca, transmite sensualidade, assim como seu jeito de andar.

Por usar saltos altos, caminha vagarosamente até o bar, consciente de que todos a acompanham com olhares cobiçosos. Encosta-se, abre a carteira e puxa um cigarro. O editor, parado exatamente ao seu lado, pega prontamente o isqueiro e acende o cigarro, já em sua boca carnuda e vermelha. “Poderia ter a honra de saber seu nome?” Pergunta o homem. Ela sorri com seus dentes perfeitamente brancos, e após soprar a fumaça para longe, responde com uma voz aveludada: “Marilyn”. O editor não consegue acreditar na sua sorte.

No dia seguinte, mal consegue levantar da cama. Sua cabeça está explodindo. Apesar disso, sua curiosidade é maior. Atravessa o quarto do hotel, abre a porta e apanha o Jornal, já colocado no lado de fora. Olha a capa, sorri, e com empolgação não sabe dizer do que sente mais orgulho: se da manchete ou da sua acompanhante, que ainda dorme profundamente.