quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Em um campeonato de Judô qualquer

Visto a camiseta, coloco a calça do quimono, e entro no ginásio. Há tempos não entrava em um lugar tão cheio. Cada lugar na arquibancada está tomado. Sinto o cheiro de campeonato no ar, e por incrível que pareça isso me acalma.

Respiro fundo. Coloco o casaco do quimono com cuidado e amarro a faixa de maneira caprichosa, mesmo sem prestar muita atenção. É a minha estreia com a faixa marrom. Sinto-me ansiosa. Tento prestar atenção na área 1, onde está tendo uma luta entre 2 garotos, mas não consigo. Páro pra escutar o que o locutor está dizendo e me dou conta de que logo será minha luta.

Então escuto. "Próxima luta na área 2, Luíza Fregapani - IEE com a faixa vermelha e Juliana Silvera -SKD". Minha mãe diz algo que eu não consigo entender, mas concordo com a cabeça. Vou andando em direção a área 2, devagar. Sinto um leve tremor na mão esquerda. Várias pessoas dizem: "Vai lá!" "Boa luta" e eu só sorrio pra elas. Minhas palavras não fariam sentido se eu tentasse responder em voz alta.

Chego e paro ao lado do juiz, que pergunta se eu sou a Luíza. Respondo afirmativamente com a cabeça e espero que ele me chame para entrar no Tatame. Então, eu respiro fundo e me concentro. Sinto todo o meu corpo. Respiro de novo, prestando atenção em cada detalhe. Pulo no lugar algumas vezes, até sentir um alívio momentâneo. Minhas pernas começam a ficar firmes. Sinto meus braços fortes. Percebo que estou abrindo e fechando as mãos para aliviar a tensão. Respiro novamente.

Me concentro mais. Desta vez vejo meus pensamentos. Fecho os olhos e imagino a luta. Imagino a minha adversária. Vejo seus passos, seus movimentos e a minha resposta a eles. Preparo dois ou três golpes. Penso nos contra-golpes. Sinto os movimentos que devem ser feitos e condiciono meu corpo a fazê-los. Parece que estou assistindo a um filme.

O juiz chama. Cumprimento para entrar no tatame e amarro a faixa vermelha, marca do primeiro lutador a ser chamado para a luta. Respiro novamente, a fim de manter os movimentos claros na minha cabeça. Olho para a minha adversária nos olhos. Ela está séria e não me olha. Parece concentrada também.

O juiz faz sinal para nos aproximarmos e nos cumprimentarmos. "Hájime" grita ele. Aproximo-me dela e seguro firme com a mão direita na gola. Ela faz o mesmo na minha. Damos uma meia volta. Ela vira agilmente e entra um Koshi Guruma. Seguro-a pelo quadril e saio do golpe. Sinto-me ficando tensa. Aproximo-me e entro o Ô-Uti-Gari, mas ela tira a perna. Damos mais uma volta, ela tenta um Seoi-Nague. Eu giro o corpo e tento o contra-golpe. Ela joga o corpo na direção oposta e fica de frente pra mim. Movimentamos um pouco pelo tatame, tentando observar os movimentos uma da outra.

Respiro fundo e lembro-me dos movimentos que tinha imaginado. De repente tudo para. Não escuto mais nenhum barulho. Parece haver apenas nós duas no universo. Rapidamente troco a pegada da gola para a mão esquerda. Neste momento vejo tudo em câmera lenta. Ela fica confusa e demora 1 segundo pra trocar também. Aproveito o momento. Puxo-a para perto de mim, enquanto giro o corpo. Em seguida flexiono de leve os joelhos, encaixo o quadril e entro o golpe. Mal tenho tempo de sentir o corpo dela nas minhas costas antes de jogá-la e vê-la deitada no chão.

"Ippon, Soromadê" diz o juiz. Acabou. Respiro novamente, estendo a mão para ajudá-la a levantar. Volto a enxergar o ginásio, as pessoas. o barulho agora parece ensurdecedor. Cumprimento-a pela luta, e cumprimento novamente antes de deixar o tatame.
Sinto um alívio a medida que a endorfina toma conta de mim e sorrio, com uma das melhores sensações do mundo: Aquela que só os vencedores conhecem.

2 comentários:

  1. FAN-TÁS-TI-CO!

    Além de merecer os parabéns pela vitória, merece um produtor de cinema pra produzir esse roteiro...

    bjos

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